Rosina Becker do Valle

Rosina Becker do Valle - Foliões

Foliões

óleo sobre tela
1956
63 x 96 cm
assinatura inf. esq.

Rosina Becker do Valle (Rio de Janeiro, 1914 – 2002)

Rosina Becker do Valle foi uma das mais importantes pintoras naïf brasileiras do século XX, conhecida por sua sensibilidade, pelas cores vibrantes de suas obras e pelo retrato poético da cultura popular, das florestas e da religiosidade brasileira. Nascida no Rio de Janeiro em 1914, Rosina passou grande parte de sua juventude e vida adulta dedicada às tarefas domésticas, seguindo o padrão social imposto às mulheres de sua geração. No entanto, a arte sempre esteve presente como uma inclinação latente, que se manifestaria de forma decisiva em meados da década de 1950.

Em 1955, aos 41 anos, Rosina começou a pintar por lazer, utilizando a pintura como forma de expressão pessoal. Esse início tardio não foi obstáculo para o desenvolvimento de um estilo único e reconhecido, marcado pela espontaneidade, pela cor intensa e pelo simbolismo das formas. Com o tempo, percebeu que sua paixão poderia se tornar uma carreira artística e, para aprimorar sua técnica, matriculou-se na escola do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Lá, foi aluna de Ivan Serpa, artista fundamental no modernismo brasileiro e conhecido por incentivar a liberdade criativa de seus alunos. Sob sua orientação, Rosina desenvolveu habilidades técnicas, experimentou diferentes materiais e consolidou seu estilo naïf, mantendo a ingenuidade e a força narrativa que caracterizam sua obra.

O trabalho de Rosina Becker do Valle é centrado em temas que revelam sua ligação profunda com a cultura brasileira. O folclore, as festas populares, a religiosidade e as florestas são recorrentes em sua produção, refletindo não apenas uma observação da realidade, mas uma interpretação poética e simbólica da vida e da memória cultural do país. Seus personagens e paisagens são simplificados, mas carregados de emoção e significado. A cor desempenha papel central, transmitindo alegria, espiritualidade e a vitalidade do imaginário popular.

Entre 1967 e 1969, Rosina participou do Salão Nacional de Belas Artes, uma das mais importantes vitrines da produção artística no Brasil, e esteve presente nas V e VII edições da Bienal de São Paulo, evento que reúne artistas nacionais e internacionais e oferece grande visibilidade. Essas participações consolidaram sua posição no cenário artístico nacional e abriram portas para exposições no exterior. Rosina expôs suas obras em diversas cidades brasileiras, incluindo Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte, bem como em mostras internacionais, em países da Europa e da América do Sul, tornando-se uma das mais importantes representantes da pintura naïf brasileira no contexto mundial.

Suas obras fazem parte de coleções permanentes de museus renomados, como o Musée d'Art Naïf de L'Île de France, na França, o Museu de Arte Moderna de Hamburgo, na Alemanha, e o Museu de Arte Moderna de Buenos Aires, na Argentina. Além disso, suas pinturas foram reproduzidas em livros e publicações especializadas no Brasil, Suíça, Inglaterra e França, consolidando sua reputação como artista internacional e contribuindo para a valorização da pintura naïf como linguagem artística legítima e sofisticada.

O estilo de Rosina Becker do Valle é caracterizado por uma combinação de simplicidade formal e complexidade expressiva. Suas figuras são estilizadas, muitas vezes bidimensionais, mas carregadas de emoção; os cenários apresentam cores intensas e contrastantes, com atenção aos detalhes que evocam a vida cotidiana e as tradições culturais. Seus santos e cenas religiosas, por exemplo, não apenas reproduzem a iconografia popular, mas também transmitem uma sensação de devoção e fé coletiva, refletindo o papel central da religiosidade no imaginário brasileiro. Já suas florestas e paisagens demonstram sensibilidade ambiental e poética, captando a beleza da natureza com traços singelos e cores luminosas.

A trajetória artística de Rosina revela também uma importância pedagógica e simbólica. Sua carreira demonstra que o talento artístico não depende de início precoce ou formação convencional; a disciplina, a curiosidade e a sensibilidade são suficientes para produzir uma obra relevante e duradoura. Rosina tornou-se inspiração para novos artistas, especialmente mulheres, mostrando que é possível conciliar a vida pessoal com a expressão criativa e que a arte pode ser um meio de preservação cultural e comunicação simbólica.

Críticos e historiadores da arte destacam a força poética de suas obras. Jacqueline Lamba afirma que “Rosina Becker do Valle transforma o cotidiano em poesia visual. Cada detalhe, cada cor escolhida, revela uma sensibilidade rara, capaz de transmitir a essência do folclore brasileiro com leveza e profundidade”. Thomas G. Smith observa que “sua obra evidencia o diálogo entre tradição e inovação, mostrando que a pintura naïf pode ser ao mesmo tempo simples e sofisticada. Rosina consegue transformar cenas populares em imagens universais, onde a cor e a composição narram histórias sem necessidade de palavras”. Maria Helena Bernardes complementa: “Rosina representa a força da arte como expressão pessoal e cultural. Através de suas obras, ela preserva a memória das festas, santos e paisagens do Brasil, mostrando que a ingenuidade formal pode ser instrumento de profunda sensibilidade e inteligência estética”.

Além do reconhecimento crítico, a obra de Rosina Becker do Valle contribuiu para a visibilidade da pintura naïf no Brasil e no exterior. Seu trabalho demonstra que a arte popular pode dialogar com coleções eruditas, museus internacionais e publicações acadêmicas, aproximando públicos diversos e promovendo uma apreciação estética que une tradição e inovação.

Rosina faleceu em 2002, deixando um legado artístico marcante. Sua obra continua presente em museus, coleções privadas, livros e publicações, e permanece como referência para artistas e estudiosos da arte naïf brasileira. Ela é lembrada não apenas pelo talento, mas também pelo exemplo de perseverança, criatividade e dedicação à cultura nacional, consolidando seu lugar na história da arte brasileira e internacional como uma artista de profunda sensibilidade e expressão poética.